domingo, julho 22, 2007

Frente parlamentar quer proibir aborto também em caso de estupro

Lei de 1940 permite interrupção da gravidez fruto de violência sexual ou quando há risco de morte da gestante
Criada em abril passado, a Frente Parlamentar Contra a Legalização do Aborto - Pelo Direito à Vida tornou-se um dos grupos mais atuantes do Congresso Nacional. Com 199 parlamentares, entre deputados e senadores, o que representa 33,5% das duas Casas, a frente tem agitado os corredores da Câmara com seminários e prepara uma nova ofensiva: a distribuição de uma cartilha intitulada Por que Somos Contra o Aborto, com 30 mil exemplares.A versão preliminar da cartilha, editada pelo presidente da frente, deputado Leandro Sampaio (PPS-RJ), não só combate a legalização do aborto como critica a autorização para a interrupção da gravidez nos casos de estupro, como prevê a lei atual. O aborto em caso de risco para a mãe, outra hipótese permitida pelo Código Penal, é questionado na cartilha, com o argumento de que os avanços da medicina permitem salvar vidas mesmo em casos de extrema gravidade. Com exceção dessas duas circunstâncias, o Código Penal prevê prisão de um a três anos para a mulher que se submete ao aborto ou que o provoca em si mesma. Para quem provoca o aborto, com consentimento da gestante, a pena é de um a quatro anos.No capítulo 'Seria lícito o aborto no caso de risco de vida para a mãe?', a cartilha apresenta como 'argumento errôneo' a tese de que se trata de um aborto lícito porque entre a vida da mãe e a do filho é melhor optar pela mãe. 'O argumento se refere ao chamado aborto terapêutico, que pode ser considerado desatualizado. Há muito tempo atrás, a medicina não dispunha de meios ou condições para salvar a vida da mãe sem interromper a gravidez. No entanto, esta ciência, bem como a biologia, a genética e tantas outras, evoluíram muito nas últimas décadas, especialmente com o advento dos aparelhos de ultra-som, podendo-se tratar o feto dentro do próprio útero', diz trecho do livreto de 31 páginas.
O debate em torno do aborto ganhou força desde que o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, considerou a prática 'um problema de saúde pública' e lançou a proposta de que a sociedade discuta uma nova legislação sobre o tema.
REAÇÃO
Tanta mobilização dos grupos antiaborto se explica: está em análise na Comissão de Seguridade e Família da Câmara o projeto de lei de autoria do deputado José Genoino (PT-SP) que descrimina a prática do aborto para as mulheres com até 12 semanas de gestação. O projeto também permite o aborto nos casos de má-formação do bebê, em qualquer período da gravidez. A lei atual não autoriza o aborto nesses casos, mas muitas mães já conseguiram na Justiça o direito de interromper a gravidez de bebês anencéfalos, por exemplo. Logo no início, a cartilha contra o aborto reproduz a foto dos pés de um feto com dez semanas. 'Na décima semana, a criança está como na figura a seguir, com os pezinhos bem feitos demonstrando que o corpinho do bebê está completamente formado', diz o texto. O livreto também condena a interrupção da gravidez de bebês anencéfalos e traz fotos de crianças sem cérebro que trouxeram 'alegria para a família' no período em que viveram.A cartilha conta ainda o caso de uma mulher do Rio que conseguiu autorização judicial para abortar um bebê anencéfalo, mas foi impedida por uma liminar da instância superior pouco antes do procedimento. O texto informa que o bebê nasceu, 'a criança era muito linda e veio a óbito com três meses de idade, tendo um sepultamento com dignidade'. Segundo a cartilha, os pais da criança passaram a agradecer a atitude do advogado que impetrara o mandado de segurança contra o aborto. Relatora do projeto de Genoino na legislatura passada, a ex-deputada Jandira Feghali (PC do B-RJ) critica os militantes antiaborto. 'Até nos países fundamentalistas o risco de vida para a mãe é ressalvado na lei sobre aborto. É claro que, se a medicina puder salvar os dois, mãe e filho, melhor. Mas não entendo que defesa da vida é essa de achar que é melhor correr o risco. É uma perversidade. No caso do estupro, defendo que a mulher possa escolher se quer ou não ter o filho. Veja que o Código Penal é de 1940, plena ditadura do Estado Novo, e mesmo lá se abriram essas duas exceções. Agora, querem retroagir a antes disso.'

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